quarta-feira, 2 de abril de 2008

Eu e meu Eurico temos medo

Por Leandro Demori

Um canalha pode lhe dizer verdades mesmo sendo um canalha, e mesmo que dele nada mais se espere além de canalhices. O fato de um canalha ser desprovido de comprometimento moral não o faz um mentiroso nato. Canalhas, pelo contrário, costumam ser muito sinceros – mesmo que por trás de suas intenções sempre haja algo que não possamos ver.

Eurico Miranda é um canalha. Ao menos é o que diz o senso comum. E Eurico, como bom canalha que é, ainda é um dos poucos no futebol brasileiro que tem o hábito de falar a verdade. Talvez por que, hoje, quase todas as verdades lhe convém – ele não é “da turma” dos donos do campinho. Depois da CPI do Futebol e das brigas com a Globo, ninguém mais gosta de ser visto na companhia do nobre deputado.

Para Eurico Miranda, clube e time são coisas diferentes. Até opostas quando vistas como NEGÓCIO. Para mim, também. Para Eurico, um clube (em essência) não precisa ter lucro com a venda de jogadores. Já um time, sim. Eurico diz que o São Caetano é um time, e o Vasco, um clube. Para mim, a RS Futebol é um time – clube é o Grêmio.

Eurico Miranda administra um dos estádios mais antigos do Brasil, fundado em 1927, palco para comícios de Getúlio Vargas, concertos deVilla-Lobos, desfiles de escolas de samba, jogos da Seleção Brasileira além, é claro, partidas do próprio Vasco. Em ditos modernos, o São Januário poderia ser chamado de arena multiuso. Por que não? A despeito da história, acredito, Eurico gostaria de ter um novo e moderno palco para os jogos de seu time. Ah, gostaria. Mas o Eurico (esse canalha) sabe o que pode haver por trás de uma obra de concreto, torcida e milhões de dólares.

Meu lado “Eurico Miranda” tem medo de arenas. Eu até tento ser mais otimista, mas meu Eurico não deixa. Quando o Grêmio começou a falar em arena, meu Eurico disse: “ó, te falei?”. Pensei logo em uma ARENA DE TOUROS cheia de animais ferozes bufando, com marcas de empresas tatuadas na testa, e eu (nós, meu Eurico junto) lá no meio, com a bandeira do Grêmio na mão tentando sobreviver. Arena? E nossas dívidas? De onde virá o dinheiro? Por que alguém desejaria construir uma arena e entregar ela nas nossas mãos? E quanto ao Olímpico?

Eu e meu Eurico somos teimosos. Está todo mundo festejando a arena do Grêmio – torcida, imprensa, dirigentes, construtora. Mas nós não. Nós estamos com medo por velhos de saber como as coisas são feitas por aí. Há pouco (ou quase nada) explicado aos sócios e torcedores do Tricolor. Antes de tudo, penso que administradores dessa obra deveriam responder judicialmente por qualquer irregularidade (que possa ser) encontrada. Se a construção da arena for o samba do crioulo doido que é o futebol nacional, uma luz vermelha se acenderá. Será meu Eurico na escuridão: “viu, eu te disse”.

Longe de pré-julgar qualquer liderança, sei que o novo estádio mudará para sempre a história do clube Grêmio Foot-ball Porto Alegrense, uma instituição muito maior do que qualquer dirigente. E que precisa ser cercada, portanto, para não sangrar.

Há também outras questões.
O que se pretende fazer com as vilas vizinhas ao local da obra? Se nada, será mais perigoso ir à nova arena do que a Bagdá em dias de mutirão terrorista. O local, hoje, é assustador.

Alguém por acaso sabe como a arena vai se chamar? Temo ter que assistir a jogos em um estádio com nome de companhia aérea, operadora telefônica ou bandeira de cartão de crédito. Rejeito a idéia de meu clube virar um time, somente afeito aos negócios, lojinhas de coisicas e atrações turísticas. A arena não pode, jamais, ser mais importante do que o próprio Grêmio (e isso quem me disse nem foi o meu Eurico).
São muitas as perguntas sem resposta e nós temos muito medo.

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