quarta-feira, 30 de abril de 2008

Rehab não

Por Leandro Demori

Costumo discordar da direção do Grêmio em muitas coisas, seja ela qual for. Ao contrário de boa parte da crítica, não tenho parentes ou conhecidos pelos corredores do Olímpico. Sinto-me livre para bater sem dó. “Imprensa é oposição; o resto é armazém de secos e molhados”, diria Millôr Fernandes. Hoje, no entanto, peço licença a Millôr para ficar do lado de lá do balcão. Não que Odone e Krieger fujam do óbvio ao dizer que não é o momento de trazer Jardel de volta. Mas preciso reconhecer que é difícil não cair em tentação. Repatriar Jardel, afinal, é o sonho de 100 em cada 100 gremistas. Caso anunciasse o retorno do camisa 16, Odone dissiparia as nuvens negras que pairam sobre a Azenha e teria apoio incondicional por um tempo confortável. Mas o futebol é perigoso.
Consideremos algumas questões.

Jardel é ídolo inegável para quem o viu jogar, e mito aos que ainda eram muito novos para ter a real dimensão do que ele representava para o Grêmio. Quer manchar essa história? Traga-o de volta e arrisque um fracasso iminente. Mesmo que não deixe de habitar em nosso Olimpo imaginário, Jardel perderia muito da mística que conquistou. Seria crime jogar parte dessa história no lixo somente para agradar aos imediatos corações. E não tem essa de trazer para “ver qual é”. Se vier, é para entrar em campo cercado de expectativas que, se não cumpridas, podem se transformar em decepção. O humor das arquibancadas muda como o vento.

Jardel precisa de ajuda. Ajuda médica. Na entrevista ao Globo Esporte, o atacante declarou que não usa cocaína há dois meses. Pelo que disse, o consumo começou há muitos anos. Dois meses de abstinência, portanto, é recesso curto, e não vai ser o mundo do futebol que curará o atacante. Esqueça a imagem do esporte como céu da vida saudável; no meio futebolístico, muitos sabem, a droga é companheira cotidiana – um perigo para quem precisa de afastamento máximo. Além disso, não são poucos os jogadores que garantem ser o futebol lugar de poucos amigos. E é de amigos que ele mais precisa nesse momento.

Não acredito que o Grêmio deva alguma coisa a Jardel. A relação de sua possível volta não pode passar pela porta da gratidão. Se for assim, a chance de repetir o retorno fracassado de Paulo Nunes é grande (na época, ficou clara a intenção do clube em aposentá-lo com bolsos cheios). No Grêmio, a dupla eterna de goleadores ganhou dinheiro, conquistou títulos e bons contratos. Jardel, mais precisamente, antes de vestir nossa camisa era vaiado até quando pegava banco no Vasco. Aqui, por ele, fizemos até mesmo a campanha “fica, Jardel”, honra que poucos jogadores tiveram. Depois de estourar no Tricolor, o atacante foi para a Europa. Penso que estamos quites.

Se conseguir se curar do vício, voltar à forma física e reconquistar o futebol, aí sim, se abre uma possibilidade. Seria melhor que Tuta, por exemplo, apenas um ano mais novo. Fora isso, é arriscar manchar parte da história para as gerações futuras, que somente se lembrarão daquele magrelo barrigudo que (diziam) era craque nos anos 90, “mas na minha época não jogou nada”. Se for para dar margem ao erro grosseiro, ok, vai daqui a minha lista de sugestões: Arilson e Casagrande. A festa de chegada do trio pode ter show da Amy Winehouse, no novíssimo Rehab tricolor. Por que Refis é coisa de são-paulino.

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