segunda-feira, 28 de janeiro de 2008

O Grêmio é do mundo

Por Silvio Pilau

Quem acompanha, vive e respira futebol sabe que poucas coisas são melhores do que uma boa discussão. Aquela conversa que começa tranqüila, entremeada por goles de cerveja bem gelada, sobre a última contratação, e que termina em entusiasmados gritos sobre os maiores ídolos da história. Discussão acirrada, mas sempre pacífica, é a verdadeira alma da rivalidade. Sabe-se que é impossível mudar a opinião de quem está do outro lado, mas a satisfação em desferir um argumento irrepreensível é como atingir o nirvana.

Nos embates oratórios entre gremistas e colorados, existem três tipos de argumentação: as indispensáveis, que nunca ficam de fora, como o título mundial reconhecido pela FIFA; os ocasionais, que surgem de acordo com o momento, como o fato de um ter o time melhor que o outro; e os ases na manga,, aqueles que podem ou não ser utilizados, variando de acordo com o andamento da arenga.

Neste último, um dos mais explorados pelos vermelhos contra o Grêmio é a forte identificação tricolor com nossos vizinhos platinos. Os colorados simplesmente não aceitam isso. Para eles, um clube brasileiro dizer que tem raça argentina e sangue uruguaio é um demérito, uma rejeição de sua própria terra. Eles adoram falar mal da melhor torcida do Brasil, dizendo que é falta de personalidade imitar os hinchas castelhanos. Claro que, ao afirmarem isso, esquecem-se que sua torcida mais fiel, a tal da “popular”, não passa de um arremedo da Geral e das torcidas argentinas. Mas isso não vem ao caso.

O que importa, nesta questão, é que não existe problema no fato de o Grêmio se identificar com o futebol jogado nos países ao lado. Muito pelo contrário. É uma escola de tradição, vencedora de quatro Copas do Mundo, dezenas de Libertadores e outro tanto de títulos mundiais. Uma forma de jogo admirada não somente aqui, mas no mundo inteiro, pela capacidade de transformar cada lance da partida em um momento de vida ou morte.

O Grêmio tem isso. Todo gremista carrega estas características em seu sangue, com muito orgulho. Futebol bonito, de embaixadinhas e dribles de foca, é bom de se ver, mas não ganha jogo, muito menos título. Prefiro um carrinho que tente recuperar a posse de bola do que um chapéu que arrisque perdê-la. Assim a História deste clube foi erigida. Com sangue, suor e muitas lágrimas, como afirmou o ex-primeiro-ministro britânico e gremista Winston Churchill.

Mas esta bravura inigualável faz do Grêmio um time uruguaio ou argentino, como dizem? Claro que não. A identificação existe, claramente, mas os gremistas não estão nem preocupados com o que acontece no além-fronteira. Por mais que, alguma vez, os hermanos tenham servido de inspiração, hoje tanto a torcida quanto o estilo de jogo tricolor possuem identidades próprias, moldadas a brasa, a ferro e a fogo em duelos de hombridade e honra nas arenas de todo o planeta.

Não sendo platino, então, o Grêmio é um time brasileiro? Também ouso afirmar que não. Carregamos, sim, por muitas vezes, a bandeira tupiniquim a cidades e países que não conheciam Porto Alegre, Rio Grande do Sul ou até mesmo o Brasil. Construímos a reputação de ser um dos maiores clubes brasileiros de todos os tempos. Nossa trajetória está marcada, indiscutivelmente, na História desta terra extensa e bela chamada Brasil.

Mas não. O Grêmio não é um clube do Brasil. Nem do Uruguai, da Argentina, Chile, Paraguai, Itália, Sudão ou qualquer outro país. O Grêmio é um clube do mundo. Um clube que carrega, sim, no peito, o orgulho de ser gaúcho e porto-alegrense, mas que não se prende a amarras. Uma instituição respeitada em qualquer canto do planeta, que já deixou marcas indeléveis nos mais longínquos campos e corações. Marcas de chuteiras, de gols, de vitória. Marcas de bravura e de valor, capazes de despertar paixão até em quem não acompanha futebol.

O Grêmio não pertence a país algum. O Grêmio pertence a todos. Admirado e temido, amado e odiado. Acima de tudo, respeitado. Não somente pelo futebol jogado, mas pela postura. Pela capacidade de construir atletas, torcedores e homens de verdade. Seres humanos de valor, de fé no impossível e força imensurável. Um clube vencedor até nas derrotas.

Gigante, muitos o são. Imortal, apenas um.

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